quarta-feira, 16 de junho de 2010

2% da população brasileira sofrem do Transtorno do Comer Compulsivo

A psicopatologia leva à ingestão de grandes quantidades de alimento em curtos intervalos de tempo para compensar algum tipo de vazio interior.


“Esta pessoa é especial pra mim porque... “ Quase nunca conseguimos exprimir com palavras o quanto alguém se torna imprescindível em nossas vidas. É como se nos completasse, acreditamos que a pessoa é capaz de nos conhecer melhor que nós mesmos, de perceber os traços mais perfeitos. Chega a ser impossível imaginar como seria a vida sem aquela pessoa por perto. Mas, mesmo querendo o contrário, sabemos que um dia a perderemos. E a questão é: será que estamos preparados para suportar esse vazio?
A bacharel em Direito Amanda Costa* (32) e a administradora Patrícia Nogueira* (25) participam do grupo Comedores Compulsivos Anônimos (CCA). O CCA se reúne todas às segundas–feiras na internet para contar as mais variadas histórias envolvendo compulsão. Porém, esses dois casos chamam a atenção por um agravante: a perda de pessoas amadas.
Amanda conta que sempre quando se sentia triste ou ansiosa era ao prazer dos doces que recorria. “Não sei, me sinto melhor ao ingeri-los”. Mas com a morte da mãe, há dois anos, ela passou a se sentir cada dia pior. “Parece que somente os doces preenchem o vazio que a falta dela me faz. Há dias que eu chego a comer cinco barras daquelas grandes de chocolate em uma hora e meia. Quando o doce perde o efeito, me sinto incompleta e faço tudo outra vez. Engordei dez quilos em um ano. A minha mãe era tudo pra mim, eu só tinha a ela e agora estou sozinha.”
A história de Patrícia é um pouco diferente, mas não menos triste. Desde que o namorado Bruno* morreu em um acidente de carro quando ela tinha 18 anos, a vida dela não foi mais a mesma. “Perdi a vontade de sair de casa, me afastei dos amigos. Eu o amava muito, ele foi meu grande amor, mesmo depois de tantos anos, a dor ainda é grande. Meu prazer é quando estou em frente a um prato cheio de macarrão sabendo que eu posso devorá-lo todo! Esqueço de toda essa tristeza que eu sinto”.
Amanda e Patrícia sofrem do chamado Transtorno do Comer Compulsivo (TCC). Trata-se de uma psicopatologia em que o indivíduo passa a emitir o comportamento de ingerir grandes quantidades de alimento em curtos intervalos de tempo sem um comportamento compensatório, como ocorre na bulimia. A compensação é o preenchimento do vazio que a pessoa sente que pode ser por vários motivos, no caso, o deixado pela morte das pessoas queridas. O alimento adquire a função de substituidor. Segundo dados da Revista Brasileira de Psicologia, o Transtorno do Comer Compulsivo está presente em 2% da população brasileira, sendo que quase 30% destes estão em tratamento.
Para o psicólogo Álvaro Velloso, um fator que pode desencadear o TCC é o estabelecimento de uma relação na qual tentamos colocar características próprias no outro. “Quando vem a perda, existe o sentimento de que uma parte de nós está indo com aquela pessoa que se foi”. O comportamento compulsivo está associado às características próprias do indivíduo que é constituído pela filogênese (características genéticas), antogênese (história de vida) e o meio onde está inserido.
O indivíduo com TCC tende a comer mais rápido do que o normal; ingerir grande quantidade de comida, estando com fome ou não e a sentir vergonha das quantidades que come. Após o episódio, o indivíduo se sente deprimido, o que faz com que repita o processo.
Tratamento
O tratamento do TCC é multidisciplinar. O paciente deve ter acompanhamento nutricional e psicoterapêutico. Segundo a nutricionista Andréia João, a atuação do nutricionista em distúrbios alimentares como o TCC está relacionada com a garantia do suporte nutricional adequado, evitando que o paciente ganhe muito peso em um curto período, o que faz com que a pessoa desista do tratamento. A nutricionista destaca o papel da psicoterapia. “O TCC se trata de uma patologia psicológica com conseqüências alimentares”.
Já o trabalho do psicanalista é ajudar o indivíduo a compreender a diferença entre ele e o outro, que possui um lugar único, mas que a vida pode seguir sem a presença da outra pessoa. “O indivíduo aprende que a perda é um processo natural” diz Álvaro Velloso.
O psicólogo destaca a atuação dos grupos, como o que Amanda a Patrícia participam. “Os grupos têm a função de fortalecer esse indivíduo. É uma forma de buscar como lidar com esses problemas, tanto da compulsão como a perda. Os grupos exercem uma função valiosa”.
A luta contra o TCC é possível, desde que a pessoa esteja disposta. Tratamentos psicoterápicos aliados ao acompanhamento de nutricionistas têm contribuído para a recuperação, tanto emocional quanto nutricional, pois nesse tipo de caso ainda não há conhecimento de cura total. O paciente aprende a ter controle sobre os episódios compulsivos, culminando na perda de peso.
* A pedido dos entrevistados, os nomes dos personagens foram trocados.

beeijo ;*
Morena

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